Entrevista com Tânia Alexandre Martinelli – Autora de “Olhar de frente”

6 de agosto de 2020


Entrevista com Tânia Alexandre Martinelli – Autora da obra “Olhar de frente”, aprovada no PNLD Literário 2020

– O livro é um grande núcleo de aprendizado sobre as diferenças sociais no Brasil. Como foi feita a sua pesquisa para o livro, a fim de retratar os diferentes mundos que nele estão?

Olhar de Frente começou a ser estudado quando, em Porto Alegre, um dos meus livros foi transcrito para o braille. A partir daí, visitei um dos institutos voltados para deficientes visuais, conversei com adultos, jovens e crianças, e acabei frequentando o lugar por seis meses. Dessa forma, pude vivenciar um pouco o dia a dia deles, conhecendo o espaço e os cursos oferecidos. Foi uma experiência enriquecedora para a criação dos personagens Beto e Vladmir e da própria narrativa. O personagem Sebastião faz parte de outro núcleo da história; é um catador de material reciclável, analfabeto. Para criá-lo, pesquisei muito sobre a Educação de Jovens e Adultos (EJA), sobre as dificuldades existentes, tanto por parte dos alunos como dos professores.

 

– A história tem três personagens passando por situações de vida muito específicas, cujas emoções são inerentes ao sofrimento humano e os levam ao amadurecimento. Como você escolheu as formas de linguagem para levar ao jovem leitor esses temas, que são fortes, mas que possibilitam tanta discussão e reflexão pós-leitura?

Vladmir é um fotógrafo e exímio leitor, que perdeu a visão na maturidade. Naturalmente, sua linguagem, e mesmo o modo de pensar a vida, é diferente da de Beto, um adolescente de 15 anos que nasceu com baixa visão, perdendo-a completamente ainda na infância. Vladmir se angustia porque não pode mais ler os livros que amava nem fotografar, enquanto Beto está inserido no universo adolescente de maneira mais natural: gosta de escrever poesia, tem sua turma de amigos e, até a infância, não tinha sentido qualquer problema com a falta da visão. Mas com a chegada da adolescência tudo muda, surgem novos dilemas não percebidos antes. Sebastião é analfabeto; a informação chega até ele pelas notícias ouvidas pela televisão, pelo rádio e também por meio dos filhos. Há um grande incômodo pelo fato de não poder acompanhar a escola deles, já que ele mesmo não estudou. São visões de mundo diferentes, com obstáculos a serem vencidos. O teatro é outra expressão que aparece no livro, ligando essas três pessoas.

 

– Com a pandemia, as pessoas precisaram se reinventar e enfrentar dificuldades pelas quais a maioria delas não havia imaginado que passariam. Como você imagina que os protagonistas enfrentariam essa situação no mundo real?

Os deficientes visuais aprendem algo muito importante no instituto, que é o mesmo que todos nós almejamos: ser independentes. Eles aprendem a se virar sozinhos, seja transitando de um lugar a outro para fazer compras, seja em casa, cozinhando, lavando, passando. Muito mais difícil é para aqueles que não têm essa autonomia porque não aprenderam, porque ficaram desde cedo só em casa, com a família achando que isso não seria possível. Mas aprendi que eles são capazes de levar uma vida independente, de ir a um cinema ou ao teatro, de usar a internet, de se comunicar pelas redes sociais. Hoje todos nós estamos mais distantes um do outro, fazendo uso das redes sociais para podermos nos comunicar e estudar. Eles também fazem isso. Falam no celular, navegam pela rede, postam fotos, comentam. Penso que as dificuldades sejam as mesmas de antes da pandemia: falta de semáforos sonoros, calçadas abandonadas, com buracos, sinalizadores assentados incorretamente. Antes da pandemia e durante esse período, a luta continua.

Confira mais informações e navegue pela obra em: https://pnld2020.com.br/olhar-de-frente/